Rio – Profissionais da rede federal de saúde deram início a uma greve e fizeram uma série de reivindicações em manifestações nesta quarta-feira (15). A paralisação por tempo indeterminado foi aprovada em assembleias no início do mês e, a partir de hoje, atendimentos não emergenciais e cirurgias eletivas foram suspensos. A previsão é de que as unidades permaneçam funcionando com 30% do quadro de funcionários.
A paralisação ocorre nos hospitais de Bonsucesso e Andaraí, na Zona Norte, da Lagoa e Ipanema, na Zona Sul, Cardoso Fontes, em Jacarepaguá, na Zona Oeste, e dos Servidores do Estado, na Saúde, no Centro. Segundo o Sindicato dos Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social no Estado do Rio (Sindsprev/RJ)), os servidores são contra a divisão da gestão das unidades entre a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), o Grupo Hospitalar Conceição, o Governo do Estado e a Prefeitura do Rio, o que chamaram de “fatiamento”.
“Nós somos completamente contra a privatização e transferir as nossas unidades para o Estado. Não dá para ser estadualizado, muito menos municipalizado, eles não dão conta. Nós temos condições de organizar os hospitais, desde que tenha pessoal e recursos. Essa gestão tem que ser feita pelo hospital, pelos servidores, não por uma pessoa que a gente nunca viu e não conhece como o hospital funciona”, declarou Osvaldo Mendes, membro da diretoria colegiada do Sindisprev.
Nesta quarta-feira, os hospitais federais amanheceram com placas e faixas informando sobre a greve. Enfermeira do Hospital de Bonsucesso há 29 anos, Roseane Rocha Vilela conta que tem assistido a rede se deteriorar ao longo dos anos, com a falta de profissionais, insumos e medicamentos. Ela diz que após várias tentativas de diálogo com o Ministério da Saúde, viu na greve o único meio para ter as demandas atendidas.
“A rede está se degradando, está acabando. Não temos material, não temos seringas, agulhas, materiais para cirurgias, medicamentos. Nós tivemos várias tentativas de diálogo, estivemos em Brasília na semana passada para um audiência com a ministra, passamos todas as nossas insatisfações e não vimos nada que nos levasse a crer que ela vai modificar esse quadro, muito pelo contrário, ela pareceu deixar claro que o fatiamento vai acontecer. Nós não vamos deixar, enquanto nós pudermos lutar, não vamos permitir que distribuam um pedacinho para cada um”, afirmou a enfermeira. A profissional relatou também que, até o momento, não houve comentários sobre demissão de servidores.
A auxiliar de serviços gerais Genilda Cruz, 56, conta que é paciente do Hospital de Bonsucesso há cerca de 15 anos mas, ao procurar atendimento ambulatorial na manhã de hoje, precisou voltar para casa. “Não está tendo atendimento, nem marcação, nem nada. Eu queria extrair meu dente, porque ele está quase caindo, mas quando cheguei no hospital, eles disseram que não teria atendimento. Os funcionários passam muito perrengue, mas é muito frustrante, porque não deram previsão para voltar e eu não sei para onde ir, porque eu sou paciente há muito anos, meu prontuário é daqui”, desabafou.
De acordo com o Sindisprev, por ser um setor sensível, as unidades vão manter os serviços de hemodiálise, diálise, quimioterapia, oncologia, cirurgias oncológicas, trocas de sonda e curativos queimados, cirurgias e atendimentos de emergência e urgência, maternidade, atendimento a pacientes especiais, transplantes e ambulatório de TAP.
Os servidores reivindicam ainda orçamento que dê condições aos hospitais de prestar atendimento à população e realização de concurso público para cobrir o déficit de pessoal, atualmente em torno de 60%, segundo o Sindsprev, bem como prorrogação de todos os Contratos Temporários da União (CTUs), até a realização de concurso. Os funcionários querem também a transferência para a carreira da Ciência e Tecnologia; o cumprimento do acordo de greve de 2023; pagamento do adicional de insalubridade em grau máximo e do piso da enfermagem em valores integrais.
Técnica de enfermagem em Bonsucesso, Karina Cristina, de 28 anos, relatou que esteve no hospital nesta quarta-feira para fazer a troca de um curativo de uma queimadura de segundo grau, provocada após um acidente de moto. A profisisonal conseguiu ser atendida, mas disse lamentar a atual situação da unidade, como paciente e funcionária.
“A gente tenta atender com qualidade, mas faltam algumas coisas. Às vezes, a gente compra medicamento do nosso bolso para trazer para o paciente, porque nem todo familiar tem condições financeiras para arcar com medicação. Tem medicação que a gente se junta e faz vaquinha para comprar para o paciente ser atendido, porque o tratamento depende daquilo”, desabafou Karina. A profissional disse ainda que teme perder o emprego.
“Está previsto que nosso contrato vai ser renovado até dezembro, mas a gente tinha uma rotina de contrato renovado de dois em dois anos, que é uma segurança para quem está trabalhando. E como vai ser em dezembro, vai demitir os funcionários, vai renovar? Eu tenho um filho, renova até dezembro e depois eu sou mandada embora, como fica? A gente precisa da renovação desses contratos, porque são oito mil funcionários, como vão demitir oito mil funcionários?”, desabafou Karina
Mãe da técnica de enfermagem, a aposentada Katia Alves, 57, acompanhou Karina no atendimento e também lamentou sobre as dificuldades que profissionais e usários enfrentam. “É uma vergonha, muita falta de insumo, não tem dipirona, não tem gaze, não tem luva. Está tudo muito precário. O hospital, a enfermagem precisam de apoio, senão vai acabar fechando e não pode, porque vem gente de todo lugar para cá”.
Ainda de acordo com o Sindicato, uma lista de reivindicações foi apresentada para a ministra da Saúde Nísia Trindade e para os ex-ocupantes do Departamento de Gestão Hospitalar (DGH), Alexandre Telles e Cida Diogo, além de para a coordenadora-geral de Gestão de Pessoas do Ministério da Saúde, Etel Matielo. Procurado pelo DIA, o Ministério da Saúde ainda não se pronunciou. O espaço está aberto para manifestação.
Fonte: O Dia