Além disso, a prova obtida a partir desta prática não será aceita em processos penais.
Os ministros também votaram no sentido de conceder um prazo de 24 meses para que os governos comprem e instalem equipamentos que serão usados nas revistas pessoais – scanners corporais, esteiras de raio X e portais detectores de metais.
Plenário virtual
O processo voltou à pauta no plenário virtual do tribunal nesta sexta-feira (18). A análise tinha sido interrompida em maio deste ano, após um pedido de vista do ministro Cristiano Zanin.
Prevalece o voto do relator, ministro Edson Fachin, com contribuições do decano Gilmar Mendes. Formam a maioria ainda as ministras Cármen Lúcia, Rosa Weber (aposentada), o ministro Cristiano Zanin e o presidente Luís Roberto Barroso.
Com isso, há:
- 6 votos para proibir a revista íntima vexatória e dar prazo para o governo comprar equipamentos;
- 4 votos para admitir a busca pessoal como algo excepcional, desde que não vexatória, justificada e com o aval do visitante, e com a possibilidade de responsabilizar autoridades por irregularidades.
Na reabertura do julgamento, Zanin votou com o relator, mas sugeriu um aperfeiçoamento no texto da tese para garantir segurança jurídica.
A ideia é permitir buscas pessoais (desde que não vexatórias) nos visitantes de presos, até que o Poder Público instale os equipamentos eletrônicos para o procedimento.
Relatório aponta violações em presídios de SP
Revista íntima
Na revista íntima, o visitante precisa ficar parcialmente ou totalmente nu e, por vezes, tem que se agachar e expor os órgãos genitais à observação de agentes penitenciários.
Está em discussão uma proposta de invalidar a prática, estabelecendo que ela ofende a dignidade da pessoa humana.
Mas há a sugestão de substituir o procedimento pelo uso de equipamentos de inspeção corporal, como scanners. A ideia é dar prazo de 24 meses para implantar a medida – neste período, os estados comprariam os equipamentos.
A decisão da Corte terá repercussão geral, ou seja, o entendimento deverá ser aplicado em processos que discutem a validade da revista íntima nas demais instâncias judiciais.
Começo do julgamento
O tema começou a ser julgado em 2020, em ambiente virtual. Na ocasião, um pedido de vista do ministro Dias Toffoli interrompeu a análise.
Novo pedido de vista, desta vez do ministro Nunes Marques, adiou a deliberação em 2021.
O recurso voltou à pauta em maio de 2023, quando chegou a cinco votos pela proibição da revista íntima vexatória.
Seguiram, na ocasião, a posição do ministro Edson Fachin, relator do caso — o presidente Luís Roberto Barroso, as ministras Rosa Weber (aposentada), Cármen Lúcia e o ministro Gilmar Mendes.
Voto do relator
Inicialmente, o relator propôs o seguinte entendimento:
“É inadmissível a prática vexatória da revista íntima em visitas sociais nos estabelecimentos de segregação compulsória, vedados sob qualquer forma ou modo o desnudamento de visitantes e a abominável inspeção de suas cavidades corporais, e a prova a partir dela obtida é ilícita, não cabendo como escusa a ausência de equipamentos eletrônicos e radioscópicos”.
Se for fixada esta orientação, fica proibido o procedimento em que o visitante precise ficar parcialmente ou totalmente nu e que envolva agachamento e a observação de órgãos genitais. Além disso, não poderão ser usadas em processos penais as provas obtidas a partir deste tipo de prática. As revistas íntimas desse tipo não podem ser justificadas, por exemplo, pela falta de equipamentos de detecção de metais.
Fachin ponderou que a revista pessoal por policiais ainda pode ocorrer, mas deve ser feita apenas após a passagem do visitante por sistemas eletrônicos (detecção de metal, por exemplo) e é uma medida a ser realizada apenas quando houver elementos concretos que justifiquem a suspeita de porte de produtos proibidos.
Além disso, essa busca pessoal poderá ter a legalidade avaliada posteriormente pela Justiça e, se for considerada irregular, pode levar à responsabilização dos agentes que a promoveram.
“Assente-se que é lícita a busca pessoal, porém em visitantes de estabelecimentos prisionais deve ser realizada apenas após a submissão a equipamentos eletrônicos e se for fundada em elementos concretos ou documentos que materializem e justifiquem a suspeita do porte de substâncias/objetos ilícitos ou proibidos, de modo a permitir-se o controle judicial, bem como a responsabilização civil, penal e administrativa nas hipóteses de eventuais arbitrariedades”, ressaltou Fachin.
“Todavia, o desnudamento de visitantes e inspeção de suas cavidades corporais, ainda que alegadamente indispensáveis à manutenção da estabilidade no interior dos presídios, subjugam todos aqueles que buscam estabelecer contato com pessoas presas, negando-lhes o respeito a direitos essenciais de forma aleatória. A ausência de equipamentos eletrônicos não é nem pode ser justificativa para impor revista íntima”, prosseguiu.
“Se existirem elementos concretos a demonstrar fundada suspeita do porte de substâncias e/ou de objetos ou papéis ilícitos que constituam potencial ameaça à segurança do sistema prisional, admite-se a revista manual (busca pessoal) à luz do ordenamento, sindicável judicialmente. A revista aos visitantes, necessária à segurança dos estabelecimentos penais, deve ser realizada com respeito à dignidade humana, vedada qualquer forma de tratamento desumano ou degradante”, completou.
Posteriormente, Fachin apresentou um complemento de voto, aderindo a entendimentos do decano Gilmar Mendes (veja mais abaixo).
Divergência
Durante a análise virtual, o ministro Alexandre de Moraes abriu a divergência, votando no sentido de uma tese que estabelece que a revista íntima para a entrada em presídios seria excepcional, justificada para cada caso específico e tendo a concordância dos visitantes. E que abusos de autoridades podem gerar processos contra eles na Justiça.
“A revista íntima para ingresso em estabelecimentos prisionais será excepcional, devidamente motivada para cada caso específico e dependerá da concordância do visitante, somente podendo ser realizada de acordo com protocolos preestabelecidos e por pessoas do mesmo gênero, obrigatoriamente médicos na hipótese de exames invasivos. O excesso ou abuso da realização da revista íntima acarretarão responsabilidade do agente público ou médico e ilicitude de eventual prova obtida. Caso não haja concordância do visitante, a autoridade administrativa poderá impedir a realização da visita”, propôs Moraes.
O ministro Dias Toffoli acompanhou a posição de Moraes, assim como os ministros Nunes Marques e André Mendonça.
Na ocasião, o ministro Gilmar Mendes pediu destaque, para julgamento presencial. Este destaque foi posteriormente cancelado.
Prazo para implantar a decisão
Em meio à análise do processo no ambiente virtual, o ministro Gilmar Mendes acompanhou o relator, mas propôs um prazo de 24 meses para que a decisão seja implantada. A ideia é que, durante este período, os estados comprem aparelhos de scanner corporal ou similar, com os recursos do Fundo Penitenciário Nacional (FUNPEN).
O decano sugeriu a seguinte tese:
“A revista íntima para ingresso em estabelecimento prisional ofende a dignidade da pessoa humana, especialmente a intimidade, a honra e a imagem, devendo ser substituída pelo uso de equipamentos de inspeção corporal (scanner corporal), no prazo de 24 (vinte e quatro) meses, a contar da data deste julgamento ou limitar-se à busca pessoal, na hipótese do art. 244 do CPP”.
O ministro Edson Fachin aderiu à sugestão, fixando o seguinte entendimento:
“É inadmissível a prática vexatória da revista íntima em visitas sociais nos estabelecimentos de segregação vedados sob qualquer forma ou modo o desnudamento de visitantes e a abominável inspeção de suas cavidades corporais. A prova a partir dela obtida é ilícita, não cabendo como escusa a ausência de equipamentos eletrônicos e radioscópicos, ressalvando-se as decisões proferidas e transitadas em julgado até a data deste julgamento. Confere-se o prazo de 24 meses, a contar da data deste julgamento, para aquisição e instalação de equipamentos como scanners corporais, esteiras de raio X e portais detectores de metais”.
O caso
O caso analisado é o de uma mulher absolvida da acusação de tráfico de drogas. Em 2011, foi flagrada na revista do presídio com 96,09 gramas de maconha nas partes íntimas, que seria levada ao irmão preso.
O Ministério Público do Rio Grande do Sul recorreu alegando que a situação cria uma “imunidade criminal”, dando salvo-conduto para aqueles que pretendem entrar com drogas no sistema carcerário.
Fonte: G1